segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Ahh.. que tal um bom filme durante a semana?!

Vim hoje aqui para falar-lhes, queridos internautas, a respeito de um filme brasileiro, já que precisamos prestigiar nosso cinema e suas grandes produções, então vou tratar hoje aqui do “Quanto vale ou é por quilo?”, filme de 2005, dirigido por Sérgio Bianchi.

A estrutura narrativa do filme é bastante interessante e inovadora. Mostrando a história de pequenos casos que acontecem no cotidiano, o longa-metragem também faz um paralelo com a escravidão do século XIX, mostrando o comércio de escravos e as relações de poder existentes entre os proprietários e os escravos.

O capitão do mato seria o matador de aluguel – grande existente nas grandes cidades hoje em dia – que funciona como um trabalho terceirizado, nas duas épocas. O retrato e a analogia também ressaltam a falência das instituições públicas, a “responsabilidade social” usada como marketing pelas empresas atuais, a corrupção e o individualismo, o pensar em si mesmo somente, nas duas épocas. O desfecho do filme mostra duas possibilidades que não eram propriamente esperadas pelo espectador.

O filme traz também algumas teses interessantes, tais como:
· A função social dos pobres na sociedade seria, aos olhos dos capitalistas, unicamente a de fechar o ciclo para a circulação do dinheiro;
· O individualismo das pessoas como um todo, que não se importam com as causas sociais existentes;
· A falência das instituições do país, onde o governo público não dá conta de atuar em várias áreas;
· A responsabilidade social sendo usada como estratégia de marketing para as empresas e corporações.
· A questão da mercadoria, onde se compra algo para vender mais caro. Usa-se a mercadoria e a mais-valia para se ganhar dinheiro.
· A terceirização dos serviços como uma provável nova forma de trabalho escravo.
· As ONGs têm caixa-dois, superfaturamentos, enfim, muitas delas não cumprem o seu papel de auxílio social.

Diversas frases marcam o filme e muitas delas, junto com as cenas, explicam as teses ressaltadas. Entre elas está o fato de que nas empresas que trazem o símbolo da responsabilidade social vendem até mais caro porque se dizem engajadas com o bem-comum, o que fica claro no filme que não é puramente verdade, já que ocorre a corrupção e desvio de muitas verbas públicas em prol do benefício de particulares e, nem sempre a responsabilidade social dessas empresas é voltada especificamente para uma melhoria da cidadania. Uma passagem que revela esse valor capitalista nas empresas é quando a personagem de Caco Ciocler diz em uma festa: “Invista em causas sociais: é bom para o próximo, é bom para a sua empresa”.
Além disso, explicitando mais ainda a visão necessária do lucro na sociedade capitalista, a mesma personagem diz da contratação de presidiários, sob a óptica da “re-inclusão social”, que pode ser bastante rentável aos empresários, já que se pode pagar menos à eles e estes não têm porquê se rebelarem, uma vez que precisam prestar contas à Justiça e não podem cometer nenhum desvio de conduta enquanto estão em observação.

Uma frase que é repetida algumas vezes durante a trama explicita de forma muito chocante, porém verdadeira o caráter social e político do filme: “Com o dinheiro da recompensa por trazer a escrava grávida que havia fugido, o capitão do mato poderia criar o seu filho, alimentá-lo e educá-lo com dignidade e liberdade”. Essa frase é dita quando no século XVIII e XIX, os capitães do mato recebiam a recompensa pela captura dos escravos, sendo que sacrificavam os filhos das negras (que seriam também escravos quando nascessem) para que pudessem criar os seus filhos, mostrando a diferença entre as classes sociais e o individualismo das pessoas. E nos dias de hoje, a cena é a última do filme, quando Candinho leva para casa uma recompensa e, com ela, poderia criar o seu filho com a dignidade que merecia.

Sobre a terceirização como forma de escravidão, pode-se dizer que atualmente a flexibilização das leis trabalhistas é a que marca a questão, já que não existe o vínculo empregatício entre a empresa e o trabalhador, não é necessário o oferecimento direto de férias, de folga semanal, enfim, os direitos dos trabalhadores terceirizados acabam ficando mais restritos. E a lógica do mercado, no sentido de que os pobres só servem à sociedade na questão do consumo, o ator Lázaro Ramos deixa isso claro em uma das falas de sua personagem: “O que vale é ter liberdade para consumir, essa é a verdadeira funcionalidade da democracia", explicando a tese de que eles fecham o ciclo da circulação do capital.

Outra questão marcante é a do projeto de inclusão digital proposto no filme, que seria um ótimo projeto, mas a empresa criada para isso super-faturou os computadores, criou caixa-dois, enfim, praticou diversos atos deploráveis no sentido da cidadania. Um ponto que ainda deve ser ressaltado sobre o aspecto do lucro é que na aula de gestão, que é mostrada durante o filme, os alunos aprendem a relação custo-benefício, a relação que deve existir entre beneficente e beneficiário, sempre buscando o maior aproveitamento e rentabilidade para as empresas.

O filme, baseado no conto “Pai contra mãe” de Machado de Assis e em algumas crônicas de Nireu Cavalcanti sobre a escravidão é um excelente trabalho que mostra em suas entrelinhas o pensamento clássico da sociedade capitalista em que vivemos.

Sobre a democracia, o filme nos mostra que é o sistema política vivido no Brasil – e na grande maioria dos outros países – porque é o sistema que melhor favorece o liberalismo econômico, sendo, por isso, o sistema do consumo.

É mais um filme que suscita a discussão e o pensamento, deixando todos extasiados diante da lógica perversa da sociedade, onde ninguém se importa com ninguém e os outros indivíduos somente são lembrados quando precisam fechar o ciclo de circulação do dinheiro. É-nos mostrado como muitos vêem as crianças de rua como lixos, que sujam as cidades e devem ser removidas, como os idosos são desrespeitados, abandonados em asilos, sem nenhum tratamento realmente eficaz, como as mazelas da sociedade são apagadas por causa de pequenas ações que não têm um cunho social intenso e válido de verdade.

É importante ressaltar que existem ONGs e ONGs, que nem todas agem da mesma forma e muitas lutam realmente para promover mais dignidade e cidadania para as pessoas, porém a crítica do filme recai em cima da falência das instituições públicas que além de não conseguirem cumprir com o seu papel, não fiscalizam a aplicação das verbas, permitindo que as empresas que as recebem não prestem contas verdadeiras e super-faturem todos os preços, além do desvio de verbas, que ocorre em todos os setores da nossa sociedade e faz tanto mal pra quem realmente precisa.

E vocês, o que acham da instituição de ONGs onde o governo não atua?! Ou mais do que isso, acreditam que elas funcionem de verdade?! Ou como no filme, muitas são somente fachada para o desvio de dinheiro!?
Até a próxima, Vermelho

4 comentários:

  1. Tentaremos ser justos, muitas ONGs desenvolvem um trabalho realmente sério, preenchendo as lacunas deixadas pelo poder público, destaco as iniciativas que envolvam educação, conscientização política, entre outras.

    Tantas outras foram criadas como fachada depois de se tornarem objeto de desejo pra obtenção de dinheiro fácil da pior maneira possível, já que causa essa disconfiança em uma iniciativa originalmente boa.

    Também acho relevante mencionarmos que muitas ONGs se tornaram passatempo de classe alta, sobretudo de socialites mobilizadas com a situação do próximo, mas que não abrem mão de seus artigos de luxo, partindo pro pior tipo de assistencialismo...

    ResponderExcluir
  2. Sim, as ONGs deveriam ser mais bem fiscalizadas. Sou favorável às ONGs.
    Primeiro, pq ONG não é sinonimo de assistencialismo.
    Segundo, porque por mais q muitos trabalhos devessem ser feitos pelo poder publico, sabemos que muita coisa não será feita por ele. E como diria Betinho "Quem tem fome, tem pressa".
    Terceiro, porque pode ser um espaço de conscientização (no sentido Paulo Freire do termo) das classes populares.

    Bela mensagem, caro Vermelho.

    Att,

    Bentinho

    ResponderExcluir
  3. Acho que como quase tudo por aí, existem ONGs dos dois tipos: as que fazem um trabalho sério contribuindo positivamente em melhorias sociais e as que só servem pra desviar o dinheiro.
    Creio que não seja um tópico quê de pra falar por alto e fazer generalizações.
    É necessário conhecer o trabalho feito por "tal" instituição.
    Na mesma linha, penso que estão os setores de responsabilidade social das empresas. Ok, que muitas vezes (a maioria?) é só um selo "venda mais!" mas NUNCA há aspectos positivos? ACHO que não dá pra generalizar.

    ResponderExcluir
  4. É claro que nao dá pra generalizar.. mas tb, como saber se é a maioria ou a minoria que é seria?!!? quem é que tá fiscalizando isso!?!?

    ResponderExcluir